domingo, 28 de setembro de 2008

DESCANSO II

“O domingo é o sábado cristão”. Talvez você já tenha ouvido tal afirmação. Será verdade? Vou citar aqui, alguns argumentos que já li e ouvi, favoráveis a tal tese, lembrando assim de cabeça, e tentarei responde-los um a um:
1.O domingo é, como o próprio nome diz, o “dia do Senhor”, o qual é Jesus Cristo.
Resposta: Já existia no Império Romano um “dia do senhor”, o dia de Mitra, deus importado da Babilônia. O imperador romano era o sumo sacerdote do culto de Mitra, que tornou-se a religião dos militares romanos. O título do imperador, no exercício da sua função sacerdotal era sumo-pontífice.
2.Desde o início os cristãos se reuniam no domingo, como o NT atesta, quando afirma, várias vezes, que os cristãos estavam reunidos no primeiro dia da semana. Portanto deve ser óbvio que eles já havia substituído o sábado pelo domingo, mesmo sendo judeus de nascimento.
Resposta: Todos os autores do NT eram judeus (Lucas provavelmente era prosélito, mas certamente estava sob forte influência judaica). Devemos esperar que sua descrição dos fatos adote o linguajar judaico e é o que realmente acontece. Há quem defenda que o NT (ou grande parte dele) foi escrito primeiramente em aramaico, mas, mesmo que não tenha sido, certamente há uma grande influência de expressões semíticas no grego do NT e é esperado do leitor que conheça os costumes, leis, mandamentos, sacerdócio, cultura, geografia, história e até jurisprudência judaica. É natural, portanto, que a contagem de tempo siga o modo hebraico, que considera o início do dia às 18:00Hs da nossa contagem. Desta forma, parece razoável interpretar que o primeiro dia da semana, citado muitas vezes no NT refere-se ao período entre 18:00Hs do nosso sábado e 17:59Hs do nosso domingo. Deve-se salientar que o próprio conceito de semana é uma peculiaridade judaica, incomum no mundo antigo. Devemos nos perguntar quando seria razoável esperar que os primitivos seguidores do Ungido se reunissem. Sendo judeus os primeiros crentes, gozavam de um dia de descanso garantido no sábado, e poderiam reunir-se à noite, que segundo sua contagem já era o primeiro dia da semana, após as 18:00Hs. Mesmo nas congregações mistas, no mundo helênico, em princípio haviam muitos judeus e outras pessoas interessadas no ensino hebraico, muitos dos quais já freqüentavam a sinagoga antes de conhecerem as boas novas do Messias. Para tais pessoas, o sábado já era um dia de descanso, e a noite de sábado era especialmente apropriada para uma reunião com os irmãos, visto que muitos dos participantes não tinham trabalhado durante o dia. O período diurno do primeiro dia não seria muito apropriado, visto que as pessoas teriam de trabalhar (muitos não dispunham de liberdade para estabelecer seu próprio dia de descanso). O alvorecer do primeiro dia, antes de iniciar o trabalho diário era possível, mas menos apropriado. De qualquer forma, é Lucas quem nos informa, no Livro dos Atos dos Apóstolos, que os cristãos da Judéia, conforme a palavra dos apóstolos Pedro e Tiago, eram observantes dos Mandamentos de Moisés, e isto na segunda metade do primeiro século, quando o apóstolo Paulo foi levado preso para Roma. Portanto, eram guardadores do sábado e seria estranho que eles guardassem dois dias de descanso na semana.
3.A patrística confirma que o domingo era guardado desde o início, conforme:
Justino Mártir (150D.C.) "No dia chamado domingo, todos, quer morem nas cidades quer nos povoados, se reúnem, e as memórias dos apóstolos e escritos dos profetas são lidos tanto quanto o tempo permitir; então, após a leitura, o presidente fala exortando e animando, para que estes exemplos excelentes sejam imitados; então todos nós nos levantamos e nos despedimos em oração pedindo as bênçãos espirituais de Deus."
Eusébio (265 a 340 D.C.) "Tudo o que era nosso dever para ser feito no sábado, transferimos para o dia do Senhor, pois pertence mais apropriadamente a ele, porque tem um precedente, e é o primeiro da fila e é mais digno que o sábado judeu. E foi entregue a nós para que possamos nos reunir neste dia."
Resposta: Infelizmente, muitos dos textos da patrística que chegaram até nós carregam um pesado ranço anti-semita, visto que muitos deles trouxeram do pensamento grego um ódio feroz contra os judeus. Note-se que muitos autores cristãos tentaram desvincular totalmente Jesus de sua nação, dos quais o mais exagerado foi Marcião. Muitos outros, embora menos ilógicos e menos espalhafatosos, tinham a mesma animosidade anti-judaica, que se introduziu tão fortemente nas igrejas cristãs que durante séculos estas instituições têm sido fortemente anti-semitas (como vemos até hoje, quando o CMI aplaude as propostas iranianas de hecatombe nuclear na Terra Santa). Desta forma, muito do que lemos pode ser argumentação anti-judaica. Seria perfeitamente concebível que um autor do segundo século projetasse sua própria visão anti-semita sobre o primeiro século, deixando de perceber que aquele tinha sido um período diferente, quando judeus e gentios, crentes no Messias, gozavam de muito mais comunhão. Mesmo porque, teria sido difícil o anti-semitismo entre os seguidores do Ungido no primeiro século, quando grande parte da igreja é judaica. Este assunto merece um texto inteiro e prometo escrever sobre isto outro dia, se Deus assim o permitir.
4.“O dia do Senhor” é citado explicitamente no livro de Apocalipse, provando que já era guardado no final de primeiro século com tal nome e reconhecido pelo apóstolo João.
Resposta: “O dia do Senhor” é uma expressão comum na Tanach (AT) e refere-se ao dia da vinda do Senhor (a segunda vinda, como a chamamos). É simbolizado pela festa das trombetas, que ocorre no primeiro dia do sétimo mês do calendário judaico. É razoável entender que o judeu João, profetizando sobre as últimas coisas, tenha estado em espírito no “Dia do Senhor”, dia da sua vinda. Também seria razoável supor que a revelação profética ocorreu no dia da Festa das Trombetas, que representa esse evento futuro. Mas alguém argumentará que é razoável supor que a revelação ocorreu num domingo. Há muitas ocorrências na Bíblia de “Dia do Senhor” referindo-se às últimas coisas, mas nenhuma em que se refira ao domingo (a não ser esta, como tais debatedores querem). Conforme o princípio que diz “As Escrituras interpretam as Escrituras”, as duas primeiras interpretações são muito preferíveis a esta última.
5. Os entes do Antigo Testamento são símbolos do Segundo. É bastante óbvio que o sábado, da velha aliança, é simbolo do domingo, da nova.
Resposta: Felizmente não precisamos fazer suposições sobre o que o sábado simboliza, pois a própria Escritura nos diz, nos capítulos 3 e 4 da Carta aos Hebreus:
"Por isso, irmãos santos, participantes da vocação celestial, considerai a Jesus Cristo, apóstolo e sumo sacerdote da nossa confissão, sendo fiel ao que o constituiu, como também o foi Moisés em toda a sua casa. Porque ele é tido por digno de tanto maior glória do que Moisés, quanto maior honra do que a casa tem aquele que a edificou. Porque toda a casa é edificada por alguém, mas o que edificou todas as coisas é Deus. E, na verdade, Moisés foi fiel em toda a sua casa, como servo, para testemunho das coisas que se haviam de anunciar; mas Cristo, como Filho, sobre a sua própria casa; a qual casa somos nós, se tão somente conservarmos firme a confiança e a glória da esperança até ao fim. Portanto, como diz o Espírito Santo: Se ouvirdes hoje a sua voz, não endureçais os vossos corações, como na provocação, no dia da tentação no deserto, onde vossos pais me tentaram, me provaram, e viram por quarenta anos as minhas obras. Por isso me indignei contra esta geração, e disse: Estes sempre erram em seu coração, e não conheceram os meus caminhos. Assim jurei na minha ira que não entrarão no meu repouso. Vede, irmãos, que nunca haja em qualquer de vós um coração mau e infiel, para se apartar do Deus vivo. Antes, exortai-vos uns aos outros todos os dias, durante o tempo que se chama Hoje, para que nenhum de vós se endureça pelo engano do pecado; porque nos tornamos participantes de Cristo, se retivermos firmemente o princípio da nossa confiança até ao fim. Enquanto se diz: Hoje, se ouvirdes a sua voz, Não endureçais os vossos corações, como na provocação. Porque, havendo-a alguns ouvido, o provocaram; mas não todos os que saíram do Egito por meio de Moisés. Mas com quem se indignou por quarenta anos? Não foi porventura com os que pecaram, cujos corpos caíram no deserto? E a quem jurou que não entrariam no seu repouso, senão aos que foram desobedientes? E vemos que não puderam entrar por causa da sua incredulidade. Temamos, pois, que, porventura, deixada a promessa de entrar no seu repouso, pareça que algum de vós fica para trás. Porque também a nós foram pregadas as boas novas, como a eles, mas a palavra da pregação nada lhes aproveitou, porquanto não estava misturada com a fé naqueles que a ouviram. Porque nós, os que temos crido, entramos no repouso, tal como disse: Assim jurei na minha ira que não entrarão no meu repouso; porque em certo lugar disse assim do dia sétimo: E repousou Deus de todas as suas obras no sétimo dia. E outra vez neste lugar: Não entrarão no meu repouso. Visto, pois, que resta que alguns entrem nele, e que aqueles a quem primeiro foram pregadas as boas novas não entraram por causa da desobediência, determina outra vez um certo dia, Hoje, dizendo por Davi, muito tempo depois, como está dito: Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações. Porque, se Josué lhes houvesse dado repouso, não falaria depois disso de outro dia. Portanto, resta ainda um repouso para o povo de Deus. Porque aquele que entrou no seu repouso, ele próprio repousou de suas obras, como Deus das suas. Procuremos, pois, entrar naquele repouso, para que ninguém caia no mesmo exemplo de desobediência. Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais penetrante do que espada alguma de dois gumes, e penetra até à divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração. E não há criatura alguma encoberta diante dele; antes todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele com quem temos de tratar. Visto que temos um grande sumo sacerdote, Jesus, Filho de Deus, que penetrou nos céus, retenhamos firmemente a nossa confissão. Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém, um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado. Cheguemos, pois, com confiança ao trono da graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno."
Vemos, do texto acima, que o sábado representa o descanso que o crente alcança no Messias, através da fé.
Alternativamente, outros eventos proféticos de descanso (o milênio e o mundo vindouro) podem ser também representados pelo sábado. Mas a interpretação de que ele simbolize o domingo, além de não bíblica, é totalmente estranha, visto que as coisas físicas da Primeira Aliança representam sistematicamente realidades espirituais. Se o sábado representasse o domingo, seria o único caso de um ente da Primeira Aliança representando um ente seu igual (um dia representando outro dia) e não um seu superior. Acho que nem preciso referir o quanto a primeira interpretação (que é tirada diretamente da Bíblia) é superior a esta última.
6.O sábado é o único dos Dez Mandamentos da Velha Aliança que não foi confirmado por Jesus.
Resposta: As afirmações de Yeshua (Jesus) contidas nos evangelhos, são normalmente parte de debates com mestres da lei ou ensino ao público judaico. Não são ensinos sistemáticos, mas sim, ensinos ditados pela necessidade da hora. Sendo o mandamento do sábado rotineiramente cumprido pelos doutores e pelo povo, não era necessária a sua confirmação, visto que não era posto em dúvida e era bastante respeitado nessa época. Embora não tenha sido confirmado explicitamente pelo Messias, é fato conhecido que o Mestre cumpria estritamente o calendário religioso, e não há registro de que tenha descumprido o descanso sabático injustificadamente.
7.Jesus não guardava o sábado, e induzia os judeus a não guarda-lo.
Resposta: É espantoso que cristãos tentem atribuir ao Messias o descumprimento dos Mandamentos (como faziam seus inimigos, que o mataram). Mais espantoso ainda, por negarem as próprias Escritura, as quais declaram que “Ele cumpriu toda a Lei” . Quanto à guarda do sábado, ao ser interpelado pelos seus inimigos, Ele jamais respondeu dizendo que o sábado não devia ser guardado. Pelo contrário, em todas as suas discussões ele argumentou dentro da jurisprudência judaica, provando que sua forma de guardar o sábado era superior à de seus adversários. Vemos isto nos seguintes textos:
“E aconteceu num sábado que, entrando ele em casa de um dos principais dos fariseus para comer pão, eles o estavam observando. E eis que estava ali diante dele um certo homem hidrópico. E Jesus, tomando a palavra, falou aos doutores da lei, e aos fariseus, dizendo: É lícito curar no sábado?'
Eles, porém, calaram-se. E tomando-o, o curou e despediu. E disse-lhes: 'qual será de vós o que, caindo-lhe num poço, em dia de sábado, o jumento ou o boi, o não tire logo?' E nada lhe podiam replicar sobre isto.” Evangelho segundo S. Lucas, capítulo 14.
Aqui, Ele argumenta de acordo com a jurisprudência judaica que afirma a licitude de salvar a vida de um animal no sábado. A Torah considera a circuncisão como justificativa para a quebra do sábado, e de acordo com a interpretação judaica, a circuncisão é uma cura. Onde se pode o pouco (uma pequena cura) se pode o muito (uma grande cura). Portanto, todas as curas executadas por Yeshua no sábado estão justificadas dentro da Lei.
8.Jesus induzia os judeus a abandonarem o judaísmo.
Resposta: Jesus seguia freqüentemente uma jurisprudência diferente da adotada pela maioria dos rabinos. Isto é assunto para um artigo bastante mais longo, mas adianto que seus ensinos são fortemente fundados em interpretações de rabinos anteriores. Adotar uma jurisprudência judaica menos comum é bastante diferente de se opor aos mandamentos de Moisés. Mesmo o leitor descuidado do NT perceberá que Yeshua falou sobre como apresentar os sacrifícios, como entregar dízimos e ofertas no templo, ordenou a apresentação de leprosos curados aos sacerdotes, pregou em sinagogas (e no próprio Templo), teve zelo pelo Templo, cumpria as festas judaicas e argumentava com base nas Escrituras judaicas. Tais atos não parecem os de alguém interessado em destruir a Torah. Na verdade, declarou explicitamente que não veio para destruir a Torah, mas para cumpri-la (Evangelho Segundo S. Mateus, capítulo 5, verso 17).

LUTA - Texto da Ivânia

Apenas dizer que o mal é aquilo que você faz ou deixa de fazer, é tornar simples algo que, não só não é simples, mas também envolve razão e busca diária da presença divina, para que a presença maligna não se torne mais presente que a presença divina. Diante da presença divina vem a lembrança de que você está passando por uma luta todo o tempo em que estiver vivo, pois até mesmo Jesus, sendo o primogênito de Deus, teve seus quarenta dias de amargura, tendo sua mente atormentada pela presença maligna e suas tentativas de penetrar sua mente com sentimentos de prazer e poder, já que o Diabo, não sendo onisciente, não poderá conhecer seus pensamentos se estes não forem inspirados por ele mesmo. O objetivo do Maligno é controlar as pessoas, e se alguém aceita as sugestões dele como se fossem seus próprios pensamentos, dá abertura para esse domínio.
Diz a Palavra de Deus (a Bíblia) que devemos ser rápidos no ouvir e tardios no falar, guardando assim nossa mente e coração. Nossa mente desenvolvida tem maior potencial, inclusive para o mal. Penso que, se o Senhor quisesse que soubéssemos os pensamentos alheios, teríamos todos essa capacidade de penetrar a mente humana. Logo, não podemos ter essa capacidade, por-que somos seres separados de Deus, perdidos em corrupção e vaidade.
Pense no perigo de alguém conhecer todos os seus pensamentos. Se isso nos deixa aterrorizados, então porque não aceitamos o fato de a palavra de Deus estar correta, quando diz que, melhor é ouvir do que falar. Quando falo torno-me frágil pelas minhas palavras, pois me dou a conhecer por outra pessoa, e quem disse que devemos fazer as outras pessoas conhecedoras de todos os nossos pensamentos?.
Além do fato de que, quem fala menos aprende mais, devemos prestar atenção também no fato de que, pensamentos nossos podem virar armas contra nós, usadas pelos nosso inimigos. Nesse caso específico, o diabo. O que o diabo mais deseja é conhecer os pensamentos do homem, para poder agir sem culpa, pois ele já fez isso no passado. Se não somos confiáveis para conhecer os pensamentos uns dos outros, porque nos revelaríamos o tempo todo a outras pessoas, em conversas vazias e ladainhas sem fim.
Guardar pensamentos é portanto guardar a alma; claro que devemos ter amigos para conversarmos, para nos congratular e desabafar, mas quem disse que devo dizer o tempo todo o que vou fazer, e como vou fazer?.
EXEMPLOS: na Bíblia o diabo tenta, o tempo todo, saber os passos de todos, até mesmo do próprio Jesus; mas aqueles melhor preparados e inspirados por Deus não caíram em sua lábia.
Profetizaram ao apóstolo Paulo para que fosse para determinado lugar, mas esse tomou outro rumo sem dar satisfação a ninguém. Jesus, todo o tempo em que esteve no deserto, foi indagado com propostas para que se confundisse e respondesse tudo o que sabia que iria fazer; mas Ele se manteve calado, escondendo do Diabo seus planos e ações.
Quando Jesus aparece, logo os endemoninhados gritam: "tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo!!!" Mas Jesus manda que se calem; ele não admite que os espíritos imundos dialoguem com ele, afinal essa é uma condição privilegiada. Pois conversas geram intimidades, e intimidades geram conhecimentos de um com outro, e o Filho de Deus não desejava ter comunhão com demônios, muito menos que eles o conduzissem em conversas a fim de conhecer seus passos.

A NATUREZA DO ETERNO

Uma questão freqüentemente (mal) colocada no meio evangélico é se o Bem é bom porque O Eterno o aprova ou se o Eterno o aprova por que é bom. Um argumento a favor da primeira possibilidade é que nada existe “antes” do Criador de todas as coisas. Portanto, não pode haver nenhum Bem absoluto anterior a Deus. Ou dizendo de outra maneira, Deus não é governado por nenhum ente fora dEle. Não pode portanto subordinar-se ao Bem, à Lógica ou a qualquer outro suposto Ente pré-existente. Tal argumentação é o cerne da doutrina calvinista, em suas múltiplas formas. O leitor, sabendo do meu arminianismo, já deve estar prevendo minha oposição a tal idéia. Em sua forma mais pura, tal idéia faz do Eterno o autor de todo mal e impede que o Bem seja observado pelo homem, visto que todas as coisas ocorrem por determinação de Deus e tudo que Deus faz é bom por definição. Incidentalmente, tal visão do mundo proíbe que se siga a máxima bíblica, escrita pelo salmista: “provai e vede que Ele é bom”. O que é verdadeiro por definição, não pode ser provado.
A visão do “deus oculto” de Lutero, um ente que me parece puro capricho e nenhuma bondade, é talvez a forma mais forte dessa doutrina. Em sua base, uma especulação escolástica anterior de pensadores que não podiam conciliar a existência de algum caráter divino, com Sua liberdade. O “deus livre” de Lutero, seguindo estas especulações escolásticas, é um deus sujeito a seus próprios caprichos.
Um parêntesis para uma reminiscência. Há muito me chama a atenção um texto bíblico em que o Eterno declara “Vós sois as minhas testemunhas, diz o SENHOR, e meu servo, a quem escolhi; para que o saibais, e me creiais, e entendais que eu sou o mesmo, e que antes de mim deus nenhum se formou, e depois de mim nenhum haverá. ” (Livro do Profeta Isaías, capítulo 43, verso 10). Quando eu era criança, tal texto parecia uma referência cronológica, e fazia parecer que houve um tempo em que não existiu deus algum. É claro que eventualmente, temos de abandonar a visão cronológica sobre a Eternidade, e tais questões deixam de se colocar assim.
Mas voltemos a Lutero e aos Calvinistas. Um dos elementos centrais de sua doutrina, embora talvez eles mesmos não tivessem noção disso, era a “simplicidade de Deus”. Este era um princípio adotado generalizadamente entre os teólogos cristãos, e não é auto-evidente nem bíblico. Sua origem, até onde os historiadores da filosofia discernem está na filosofia grega (muito posterior, portanto, às origens do pensamento judaico sobre Deus). A idéia de que Deus é simples entrou na teologia cristã diretamente da filosofia grega e é irrelevante para nossos propósitos debater se e quando ela teve alguma influência no pensamento judaico. Cabe aqui um parêntesis: A discussão entre judeus e as correntes principais da teologia cristã não é sobre a simplicidade da essência de Deus. A discussão é sobre se há mais de uma pessoa em Deus, o que não afeta a questão que discutimos aqui.
Sobre certos entes, que muitas vezes a filosofia e a intuição consideram como preexistentes (o Bem, o Amor, a Lógica, a Justiça, etc), minha percepção pessoal é que eles preexistem, não isolados, mas em relação uns com os outros. Além de existirem em relacionamento, existem em uma pessoa (conforme nos ensina a Bíblia), a qual chamamos de “O Eterno” ou Deus. Portanto respondo à questão inicial dizendo que O Eterno quer o bem por que isto é bom, mas seu critério do que é bom está dentro de si mesmo, não por ser Ele um ser caprichoso, mas por ser Ele a própria personalidade da Bondade. A afirmação do apóstolo João “Deus é amor”, poderia ser escrita, segundo o meu pensamento, como “Deus é Amor”. É um relação ontológica, não a descrição de uma característica.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

PRAZER, PODER E GRANA

Alguns dizem que o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males. Afirmam isto escudados em um texto bíblico, no qual a palavra traduzido em algumas Bíblias como “todos”, pode ser (e é, em outras traduções da Bíblia) traduzida também como muitos. Atualmente esta interpretação (sobre o dinheiro ser a causa de todos os males) é hoje muito difundida, por influência do pensamento marxista, que vê a vida humana centralizada na economia.

Mas, como são as pessoas reais, que o leitor conhece? O que eles querem? Provavelmente o leitor conhece pessoas que buscam coisas bem diferentes, mas que podem, na sua maioria serem resumidas em: evitar o desconhecido (preservação da vida e fuga de situações imprevisíveis, para sí mesmas e para pessoas próximas), busca do prazer (incluídos aqui os chamados “prazeres elevados”, como os intelectuais e espirituais e até mesmo a sensação de dever cumprido e o saber-se seguro, bem como ter confiança no bem estar de seus queridos) e fuga do desprazer (incluídos aqui a culpa e a percepção da própria desimportância, e a preocupação com sua própria segurança e com a de outros). Eu poderia falar também de outras fontes de impulsos dentro do homem, causas espirituais, mas deixo isto para outro dia, pois não afeta 'grosso modo' a argumentação. Adianto apenas que entre os impulsos mais importantes de ordem espiritual, está a vocação, uma percepção íntima de que há um caminho a seguir, e a intuição, uma percepção de realidades não acessíveis aos sentidos físicos ou à inteligência.

O poder é uma questão secundária. Pode trazer alguma sensação de prazer (que algumas pessoas apreciam demasiadamente), mas é fundamentalmente um MEIO para alcançar objetivos (entre eles, alcançar prazeres e evitar desprazeres). Quanto ao dinheiro, é uma forma particular de poder, cambiável até certo ponto por outras formas. Uma característica peculiar do dinheiro é poder ser acumulado e trocado por outros entes no momento mais adequado. Isto naturalmente traz uma certa sensação de segurança em relação ao futuro.

Para grande parte das pessoas, as escolhas sobre que objetivos seguir acompanham efetivamente a percepção daquilo que realmente lhes falta. Via de regra, o acumulo de dinheiro para garantia futura é deixado em segundo plano em relação a objetivos mais preementes, como educação e saúde dos filhos, e mesmo seus prazeres diários. Via de regra, quando as pessoas sacrificam seus objetivos de curto prazo (em particular, alguns prazeres) para acumulo de dinheiro, visam algum objetivo mais concreto, como um investimento em particular, que possa eleva-las a um novo patamar de segurança e/ou oportunidades, ou bem estar no trabalho (o sonho de não ter chefe, por exemplo).

Entretanto, uma parcela importante das pessoas gasta seu dinheiro para satisfazer necessidades menos óbvias. O ser humano busca ser aprovado, ser admirado, reconhecido, particularmente na adolescência, mas muitos continuam sentindo tal necessidade de forma muito forte até uma idade muito avançada. Grande parte do esforço e do dinheiro, que não deixa de ser uma forma de esforço acumulado, de uma pessoa pode ser gasta em vaidade (que significa vazio), isto é aparência. Pode ser aparência física, percepção de ser bem aceito pelo grupo, “saber” (“intelectuais” muitas vezes são pessoas doentiamente vaidosas) ou até mesmo a aparência de “pensar as coisas certas”. O que seria da religião do “politicamente correto sem o poder da vaidade? E também, sem o poder da ameaça de retirar das pessoas o seu bom nome?

As pessoas que tem bastante dinheiro utilizam apenas uma parte relativamente pequena na sua própria manutenção e de suas famílias. Grande parte do dinheiro é investido no próprio negócio. Quem vê de fora talvez imagine uma ambição maluca de tentar ganhar muito mais dinheiro do que pode gastar. Por que quem já é rico, e por qualquer padrão razoável já tem segurança econômica, buscaria aumentar seu capital? Sejamos razoáveis, só pessoas de mente muito anormal despendem todo seu esforço em algo que já tem de sobra. Quando se vê um rico investindo em seus negócios, ele busca outra coisa diferente do dinheiro. Alguns buscam a realização de provar a sí mesmos ou a outros o seu valor, sua capacidade de construir um negócio grande, que produz riqueza para muitos. Pode ser o desejo genuíno de mudar algo na economia. Talvez alguém tenha pensado por muito tempo “deveria existir tal ramo da industria neste país, isto está fazendo falta”. Há um certo componente de idealismo nas motivações de muitos empresários, o que às vezes pode tornar-se um óbice à melhor condução dos negócios.

Para muitos homens muito ricos, a auto-glorificação, o culto a sua própria grandeza ou a obtenção de poder acabam por tornar-se objetivos primordiais. Muitos ficam apenas na auto-glorificação, na qual esbanjam sua riqueza, conforme o ditado “pai rico, filho nobre, neto pobre”. Para outros, conforme as oportunidades e temperamento, a riqueza, antes que se esgote, compra o poder, como nos ensina a saga dos Medicis.

ENTENDENDO A HISTÓRIA RECENTE SOB NOVA VISÃO


Tente o leitor reinterpretar a história recente entendendo que vários impulsos diferentes movem os seus atores. Entenda o poder das necessidades psicológicas (principalmente a necessidade que as pessoas tem de verem a si mesmas como superiores, moral e inteletualmente, e verem seu “pensamento independente” apoiado pelos seus pares). Entenda a profunda necessidade de agradar (mesmo daqueles que se dizem “contracultura”) e a esperteza daqueles que sabem utilizar as necessidades dos outros. Muitos fatos visíveis ao leitor, que deveriam ser “ignorados” ou minimizados numa leitura 100% economicista, fazem todo sentido nesta nova interpretação.

Sob tal compreensão, é estranho chamar de “capitalismo” a crença nas virtudes da liberdade de mercado. Capitalismo seria o sistema que privilegiasse os proprietários de capital, dando a eles o máximo de garantias de manutenção da riqueza e poder para si e para seus filhos. Ora, em um país onde haja real liberdade de mercado, há riscos reais de grandes perdas para os proprietários de capital, e vê-se a toda hora grandes empresas afundarem e novas fortunas surgirem. É uma grande mentira que tal sistema engesse as pessoas e as famílias na sua situação social e econômica. A rigor os sistemas que buscavam preservar (e preservavam) no passado a situação econômica e social dos mais ricos e poderosos foram todos sistemas de forte intervenção estatal. Há um sistema hoje em dia que funciona assim. Uma aristocracia, dona do país, forma uma casta de privilegiados, que embora lutem entre si pelo usufruto dos bens do país e do poder político, são aliados em explorar a casta dos trabalhadores. Seus filhos casam entre si e recebem dos pais o dom de pertencerem à casta dominante. Embora os bens nacionais não sejam considerados propriedades particulares de cada membro da casta dos aristocratas esta, em conjunto, goza de seu uso, deixando para a casta trabalhadora apenas o suficiente para a manutenção (e muitas vezes, nem isso). Para manterem o sistema funcionando devem manter a casta dos trabalhadores sob forte e constante vigilância, terror e desinformação. Ajuda bastante a criação de um mito de vida gloriosa futura para a casta trabalhadora e de um suposto passado de lutas generosas e desinteressadas por parte dos membros da aristocracia. Também não se prescinde do uso de inimigos externos que estariam buscando destruir e escravizar a nação. Tal sistema pode funcionar tanto sob a égide do internacionalismo, como do nacionalismo e freqüentemente se desenvolve para um sistema de empresas “privadas” dos filhos dos oligarcas, uma espécie de “capitalismo de estado”, com fortíssima intervenção estatal, apesar da aparência de livre mercado. Na sua forma pura, tem sido geralmente chamado de socialismo e na sua forma desenvolvida, é muitas vezes chamado de fascismo. No fundo, apenas o renascimento dos antigos sistemas aristocráticos, em forma muito mais violenta e opressiva.

Como o leitor talvez tenha notado, alterei minha auto-descrição de “pró-capitalista” para “partidário da liberdade de mercado”. Atende melhor a minha atual compreensão do que realmente significam tais palavras

domingo, 21 de setembro de 2008

DORMINDO COM O INIMIGO I

Uma das boas almas que aprecio, no campo esquerdista, é a deputada espanhola Pilar Rahola. Considero impressionante seu trabalho de conscientização, buscando influenciar outros esquerdistas no sentido de agirem com alguma racionalidade e justiça. Freqüentemente escreve artigos e mais artigos mostrando a injustiça e irracionalidade de atiçarem ao máximo a fúria dos palestinos e justificarem todos os mais terríveis crimes dos mais diversos grupos terroristas, o absurdo do anti-americanismo doentio e a loucura de abortar bebes de 8 meses. Boas intenções, mas tempo perdido, o esquerdismo não pode ser essencialmente melhorado, ou deixará de ser aquilo para que foi criado.

A idéia de ter poder sobre “as massas”, de transformar o povo num monstro, sobre o qual uma pequena elite tenha poder, usando os instrumentos da vitimização do grupos escolhidos como “excluídos”, os instrumento da auto-justificação e auto-glorificação (até aos céus) da classe revolucionária, a obtenção da exclusividade da virtude e da justiça (justamente pelos mais caras-de-pau), a infantilização da sociedade, tal idéia é tão poderosa, tão perfeita para seus objetivos, que uma vez que foram desenvolvidas as suas técnicas, jamais deixarão de ser usadas, a não ser que o povo venha a estar tão consciente delas, que deixem de ser efetivas. Mas tal idéia, desde o início, é a alma do esquerdismo. Sob muitos aspectos é semelhante à opressão que sempre se praticou, à escravização do povo por uma pequena elite, opressão embrulhada muitas vezes numa teia de mentiras a respeito da ascendência divina do governante, ou alguma coisa assim. A grande novidade é a transformação da elite dominante em “povo no poder”. Quanto poder teriam César, Alexandre, ou o faraó, se conseguissem ser apresentados como membros do povo que tomaram o poder dos poderosos? Se, ao mesmo tempo que todos pintassem rei como ser sobre-humano, divino, dissessem dele que é simples homem da classe trabalhadora no poder, a qual, por meio dele, atinge todos os seus objetivos, e já não tem opressor? Se dissessem que, por meio dele, se faz a justiça completa, no momento exato em que seus oficiais estivessem subjugando, prendendo, torturando e escravizando o povo, e assassinando milhões dentre eles. Se uma mentira tão incoerente pudesse prosperar na antiguidade, o rei-sol, o rei-divino, sofreria um tremendo up-grade e se tornaria um dirigente comunista. Há maior poder e opressão do homem sobre o homem do que isto? Que psicopata, que ególatra, que paranóico não sonharia com um poder desses? Os instrumentos para realização desse sonho delirante teriam sido criados pouco antes da revolução francesa, aplicados nela, e melhorados desde então.


Virtualmente toda classe revolucionária veio das classes médias, do refugo da casta administrativa, e lutam sempre para se tornar a nova elite, galgar os postos mais altos, inclusive através da luta mortal entre “companheiros”. Mas todos tentam parecer, e até chegam a crer-se, representantes das “classes oprimidas”. Praticamente não há representantes reais dos trabalhadores braçais, e onde se encontra algum, só chega a ser considerado um “legitimo representante” das “classes oprimidas” quando já deixou de ser a tempos um trabalhador braçal e já se tornou um membro efetivo das classes médias revolucionárias, tendo absorvido seus vícios e cacoetes. Não é por acaso, que todos os chamados “líderes do povo” pelos socialistas eram originários das classes médias, e sempre gente de personalidade ególatra e em busca frenética de glorificação. Não é desvio ou distorção do que se intentava, nem seria invisível para quem olhasse o que realmente estava acontecendo na revolução francesa, na revolução russa, na chinesa, na cubana, cambojana, vietnamita, etc... Mas nada disso está nos livros de “história” que são adotados por nossas escolas.


Há uma tese defendida por alguns autores, segundo a qual esse refugo das classes médias não é a origem, é instrumento da revolução. Sua origem seria o sonho de um poder mundial, acalentado por grupos internamente coesos e organizados, momentaneamente unidos por um objetivo estratégico comum (mas já planejando como trair um ao outro). A idéia central é recriar o mito do “rei-divino” da antiguidade, projeto que sempre funcionava por algum tempo, mas eventualmente falhava, pois em todos os impérios da antiguidade o oprimido tinha consciência de ser oprimido. Na pior das hipóteses, consideraria sua própria fraqueza como justificativa aceitável para sua condição, mas jamais diria daquele que o prendesse “é meu libertador”, ou daquele que o roubasse “é este quem devolve o que me foi tirado”, ou daquele que assassinasse seu familiar “é meu protetor”.


Seria possível obter tal submissão e distorção da percepção de grande parte da população? Criar uma situação tal que mesmo a revolta íntima contra o mal fosse impensável? Fazer com que todos tivessem medo de admitir que o claro é claro e o escuro é escuro? Chamar a verdade de mentira e a mentira de verdade, na frente daqueles que poderiam enxergar a fraude, e ser crido por eles? Sabia-se há muito tempo que pode-se levar algumas pessoas a tal confusão, com um esforço concentrado, mas seria aplicável a uma sociedade inteira? O poder do blefe está na ousadia e o poder da mentira pode ser sua profusão. Era um conceito ousado, mas quem quer que sonhasse com um “estado-deus” e um “rei-divino” (houve mentira mais amplamente aplicada, mito mais buscado, na história da humanidade?) sabia que essa seria sua última chance. Os mitos antigos que sustentavam os reis-divinos já estavam caindo, só algo muito mais amplo salvaria esse conceito, a cartada final. A situação mais perfeita para realização desse conceito, seria em oposição a um rei absolutista, o que tornaria verdadeiras parte das justificativas.


Se foi de caso pensado, foi um sucesso estrondoso. Fazer uma revolução, tirar as terras de uso livre dos camponeses pobres, e vende-las para particulares, isso seria fácil. Mas fazer isso e ver tal revolução celebrada como a libertação dos camponeses? Levar os revolucionários a massacrarem, em exíguo tempo, um décimo da população do país, isso é comum. Mas transformar tal revolução em celebração da vida, uma “luz” em relação à situação anterior de trevas (que matou muito menos, seja em números absolutos, seja em relativos)? Impor um novo culto, com novos deuses, a um país inteiro, quantas vezes já se fez isso na história? Mas quem conseguiria que isso fosse chamado de “estado laico”? A revolução francesa teria sido o primeiro grande teste de um conceito, e foi, talvez, mais exitoso que a mais favorável previsão de quem quer que tenham sido seus idealizadores, cujos nomes a história não registrou. Nos séculos seguintes, muitos outros teriam aprofundado a aplicação do mesmo conceito.


Talvez seja uma teoria exagerada, não sabemos. Mas é bastante instigante.